Como já foi apresentado neste curso, diversas condições e doenças podem acometer os idosos e a nutrição tem um papel fundamental na gestão destas questões, a fim de promover uma melhor qualidade de vida nesta fase. Entre as condições e doenças mais comuns estão a dificuldade de mastigação, disfagia, desidratação, obesidade, desnutrição, sarcopenia, hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, demência, depressão e a lesão por pressão.
Estas condições requerem uma atenção específica no que diz respeito às escolhas alimentares e ao estilo de vida, a fim de melhorar os resultados clínicos e prevenir complicações. Nesta seção iremos detalhar cada condição e como a abordagem nutricional pode ser realizada.
Os idosos podem apresentar dificuldades na mastigação de alimentos, em virtude de uma saúde oral prejudicada e próteses dentárias desajustadas. A textura dos alimentos pode ser adaptada a tolerância do idoso, com alimentos mais moles e cozidos, macios e fáceis de mastigar, como purês, sopas, mingau, legumes bem cozidos, carnes moles, moídas ou desfiadas. No entanto, vale lembrar que independentemente da consistência da alimentação, as necessidades nutricionais precisam ser alcançadas, através de outras estratégias, a exemplo de refeições frequentes e uso de suplementos nutricionais.
O envelhecimento também pode influenciar no processo de deglutição, devido a alterações estruturais, podendo resultar em disfagia, que é a dificuldade para deglutir alimentos, aumentando o risco de broncoaspiração (alimentos no pulmão), desnutrição e desidratação. Inicialmente é necessário contato direto com a fonoaudiologia para determinar uma consistência alimentar segura para a deglutição, além de posições adequadas para alimentação.
Assim, a nutrição necessita oferecer uma dieta equilibrada, com níveis adequados de energia, proteínas e outros nutrientes, considerando a consistência segura e liberada pela fonoaudiologia para aquele paciente, a fim de melhorar o estado geral daquele idoso. Além disso, outras medidas devem estar presentes no dia a dia, como uma higiene oral adequada e posicionamento correto para deglutição.
Como vimos, a desidratação em idosos pode ocorrer, em virtude da redução da sensação de sede. As mulheres idosas devem consumir entre 1,6 a 2,0 litros de líquidos e os homens idosos entre 2,0 a 2,5 litros de líquidos por dia.
Para melhorar a ingestão de líquidos é possível utilizar despertadores para lembrá-los de beber água, a fim de que consumam água mesmo sem sede. Orientar o consumo de no mínimo um copo de água entre as refeições ao longo do dia e ter uma garrafa de água em um local visível também são maneiras de ajudar o idoso a não esquecer de se hidratar. Outras opções incluem oferecer bebidas além da água pura, como água saborizada (com rodelas de limão, folhas de hortelã, casca de abacaxi e outros), água de coco, sucos de frutas e smoothies, mas é necessário lembrar que estes últimos não substituem a água pura.
Obesidade
Caso o idoso tenha obesidade, a perda de peso é recomendada, devido a sua relação com o surgimento de outras doenças. É possível reduzir a ingestão calórica em até 500 calorias, mas o valor energético total não deve ser inferior a 1200 calorias por dia, com o objetivo de reduzir entre 0,25 kg a 1,0 kg por semana. Entretanto, a redução calórica deve ser lenta, a fim de evitar a perda de massa muscular. A proteína deve estar entre 1,2 a 1,5 gramas por kg, visando também evitar a perda acentuada de músculo.
Dietas muito restritivas devem ser desencorajadas em virtude do risco de desnutrição, perda de massa muscular e redução da capacidade funcional. A prática de atividade física, associada a uma dieta pobre em calorias e rica em proteínas parece ser uma boa estratégia para a perda de peso em idosos com excesso de peso.
Desnutrição
O tratamento da desnutrição em idosos requer uma abordagem cuidadosa, primeiro deve-se identificar a causa da desnutrição, se por baixa ingestão alimentar via oral, acesso adequado a alimentos ou se há condições de saúde que interferem no estado nutricional. De forma objetiva, o tratamento da desnutrição requer um aumento da ingestão calórica e proteica e tratamento da condição que levou a desnutrição.
Estratégias para melhorar a ingestão alimentar podem ser feitas através da oferta de refeições e lanches de forma frequente, entre 5 a 6 refeições por dia, e de preferência preparações ricas em nutrientes, principalmente energia e proteína, a fim de aumentar a ingestão calórica total. Alimentos fontes de proteína também devem ser consumidos nestas refeições, isso inclui carnes bovinas magras, peixes, frango, ovos e laticínios.
Inicialmente o idoso deve receber aconselhamento nutricional acerca da importância da alimentação, adaptações no cardápio, tornando-o mais saboroso, nutritivo e atrativo, que facilite a mastigação e inserção de lanches para contribuir com o aumento do aporte energético.
Os alimentos podem ser enriquecidos para se tornarem energeticamente mais densos (ricos em calorias), através da adição de óleos insaturados, leite em pó e suplementos nutricionais. Líquidos devem ser evitados trinta minutos antes ou durante as refeições, visto que prejudicam a ingestão, fazendo com que o idoso coma menos. Os suplementos nutricionais podem ser recomendados para complementar uma ingestão alimentar insuficiente, o que será mais bem descrito no capítulo de “Suplementos”.
A quantidade de calorias para o idoso com desnutrição pode chegar a 40 calorias por kg de peso corporal e a proteína até 2,0 gramas por kg, a depender do estado clínico do idoso. Ter uma abordagem multiprofissional também faz toda a diferença, com médicos, nutricionistas, fisioterapeutas e psicólogos.
Sarcopenia
O envelhecimento pode contribuir para a redução da ingestão alimentar, com diminuição da massa e função muscular, resultando em sarcopenia. A ingestão adequada de proteínas é importante para manter essa massa muscular, devido a sua função estrutural.
A recomendação de proteínas para o tratamento da sarcopenia é de 1,2 gramas por kg a 1,5 gramas por kg. Além disso, a proteína precisa ser fracionada ao longo do dia, alcançando entre 25 a 30 gramas de proteínas nas três principais refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar), a fim de melhorar o aproveitamento proteico pelo organismo.
A oferta energética também é importante nesta fase e deve ser otimizada. Idosos com peso adequado devem consumir cerca de 30 calorias por dia, e, aqueles com baixo peso, de 32 a 38 calorias por dia. A prática de atividade física também contribui com a preservação da massa muscular e tratamento da sarcopenia.
Hipertensão arterial sistêmica
A hipertensão frequentemente acomete idosos e a nutrição também pode fazer parte do tratamento desta doença. Os indivíduos devem ter uma dieta rica em frutas, hortaliças, laticínios desnatados, cereais integrais e oleaginosas, pois estes alimentos apresentam alta quantidade de potássio, cálcio, magnésio e fibras, que ajudam na regulação da pressão arterial. Além disso, quando associada a redução de sódio, doces e gorduras, a pressão arterial é ainda mais reduzida, diminuindo o risco de acidente vascular cerebral e de comprometimento do sistema cardiovascular.
Deve-se evitar o fumo, pois apresenta efeito de elevação temporária da pressão arterial e riscos para a saúde cardiovascular. A bebida alcoólica também deve ser reduzida para um ou dois drinques ou abstenção total de álcool. Caso o idoso seja obeso, a perda de peso é recomendada para ajudar na diminuição da pressão arterial. Além disso, a prática regular de atividade física também auxilia no controle da pressão.
A ingestão de sódio recomendada para indivíduos hipertensos e população em geral é de 2 gramas, o que equivale a 5 gramas de sal de cozinha. Entretanto, cabe ressaltar que essa recomendação abrange também os alimentos industrializados, ricos em sódio, ou seja, não é apenas 5 gramas de sal de cozinha, e sim de toda a ingestão diária de sódio, mesmo as provenientes de alimentos.
Quadro 7: Alimentos ricos em sódio.
Alimentos ricos em sódio | Embutidos (salames, salsicha, mortadela, presunto e linguiça), bacon, carne seca, nuggets, enlatados, temperos prontos e salgadinhos. |
Um bom exercício é ler os rótulos dos alimentos e escolher aqueles que possuem um menor teor de sódio.
Diabetes mellitus
As recomendações nutricionais para idosos diabéticos são semelhantes a de adultos com diabetes. Os carboidratos devem compor cerca de 55% das necessidades energéticas, podendo variar entre 45-65%, restringindo carboidratos simples. As proteínas podem ser fornecidas entre 1,0 a 1,5g/kg de peso corporal. E as gorduras de 20-35% do valor energético diário proposto, dando preferência as gorduras insaturadas. As fibras devem ser fornecidas em uma proporção de 14 gramas a cada 1000 calorias.
Caso o idoso tenha obesidade, a dieta deve ser normocalórica (normal em calorias) ou hipocalórica (pobre em calorias) e a perda de peso é recomendada para melhorar o controle glicêmico.
Para evitar picos na glicemia, o ideal é que o idoso sempre combine refeições contendo carboidratos com outros nutrientes, como as proteínas, gorduras e fibras, assim a absorção de glicose é retardada, o que evita a hiperglicemia, que ocorre no diabetes. Por exemplo, é valido misturar frutas com iogurtes ou castanhas, consumir raízes acompanhadas de ovos, queijos ou frango, arroz acompanhado de feijão e carnes magras, e assim por diante.
A alimentação deve ser variada, contendo vegetais, frutas, grãos integrais, legumes, laticínios, carnes magras e evitando a ingestão de carboidratos simples (doces e açúcar de mesa), gorduras e sódio em excesso.
A prática de atividade física também pode melhorar a resistência à insulina e os picos glicêmicos, pois o exercício faz com que o músculo capte a glicose sem necessitar da ação da insulina.
Doenças cardiovasculares
As doenças cardiovasculares causadas em decorrência do processo de aterosclerose também possuem importância nutricional. A gordura total da dieta deve ser no máximo 35% das calorias, e, para aqueles idosos que apresentam risco cardiovascular aumentado devem consumir menos que 7% de gordura saturada diariamente, a alimentação deve ser isenta em gordura trans por aumentar o risco cardiovascular, e deve-se priorizar a gordura insaturada. Importante ressaltar que a redução de gordura saturada não deve ser substituída por carboidratos.
O padrão alimentar deve ser resgatado a partir do incentivo a uma alimentação saudável e o mais natural possível e um preparo adequado dos alimentos. O tabagismo deve ser cessado, pois contribui com a redução da saúde cardiovascular.
Demência
Na demência pode ocorrer desnutrição no idoso devido a dependência das atividades da vida diária, principalmente as que são relacionadas a alimentação. Pode haver perda de peso contínua com a progressão da doença, sendo assim, uma nutrição adequada é crucial nesta fase.
Em fases avançadas da demência é necessário priorizar a alimentação habitual ou adaptada ao idoso, a fim de promover conforto e segurança para aquele indivíduo. Caso a ingestão alimentar via oral não esteja sendo suficiente, pode-se utilizar da suplementação nutricional oral, não sendo recomendado indicar medidas invasivas, como sondas.
O idoso com demência deve ter auxílio do familiar ou cuidador para realizar suas atividades, inclusive de alimentação, propiciando sempre o bem-estar e prazer da alimentação, não havendo controle de calorias e proteínas.
Depressão
A depressão pode ser uma condição frequente em idosos e a nutrição se torna parte deste tratamento, principalmente quando apresentam desnutrição ou risco nutricional. A depressão pode levar a deficiências nutricionais, cuja intervenção deve ser cautelosa e individualizada, pois depende da condição nutricional existente, da idade do idoso e da gravidade da depressão.
Além disso, é necessário que este idoso seja acompanhado por uma equipe multidisciplinar para um tratamento mais assertivo, contribuição para melhora do consumo alimentar e então definição mais precisa das necessidades nutricionais.
Lesão por pressão
A baixa ingestão alimentar e proteica dos idosos pode contribuir com uma dificuldade para cicatrização da lesão por pressão, assim, a nutrição adequada pode contribuir significativamente para melhora da ferida. Um consumo alimentar enriquecido em proteínas pode levar a uma redução da ocorrência da lesão por pressão, em média de 1,2 a 1,5 gramas por kg de peso corporal. A oferta energética adequada também se faz necessária, variando entre 30 a 35 calorias por kg de peso.
Os suplementos nutricionais orais podem ser utilizados como parte do tratamento para oferecer um bom aporte energético e proteico e favorecer a cicatrização da lesão.