O envelhecimento pode afetar a absorção e o uso de alguns nutrientes, além disso, idosos podem apresentar uma baixa ingestão de energia, lipídios, fibras e micronutrientes (vitaminas e minerais), como cálcio, zinco, magnésio, cobre, ácido fólico, vitamina B12, vitamina C, vitamina D e vitamina E.
Assim, conhecer as necessidades nutricionais específicas do idoso é essencial para a promoção da saúde, bem-estar e envelhecimento saudável. Portanto, neste capítulo iremos abordar detalhadamente acerca das necessidades energéticas e de nutrientes para idosos.
A energia, popularmente conhecida como caloria, é obtida através da alimentação, cuja energia está contida entre as ligações químicas existentes nos alimentos, liberadas a partir da digestão. A caloria tem o objetivo de permitir que todas as nossas células realizem as suas funções e nós nos mantenhamos vivos. Normalmente os carboidratos (açúcares), proteínas e gorduras são os grupos de nutrientes responsáveis por fornecer energia ao organismo, conforme demonstrado no Quadro 5. Enquanto as vitaminas, minerais e água não oferecem calorias, mas possuem outras funções vitais.
Vamos dar um exemplo prático: em um pão francês temos a seguinte composição:
- 29,32 gramas de carboidratos;
- 3,98 gramas de proteínas;
- 1,55 gramas de gorduras.
Logo:
- 29,32 gramas de carboidrato x 4 calorias = 117,28 calorias;
- 3,98 gramas de proteína x 4 calorias = 15,92 calorias;
- 1,55 gramas de gordura x 9 calorias = 13,95 calorias;
- Soma total: 117,28 + 15,92 + 13,95 = 147,15 calorias. Portanto, o pão francês possui 147,15 calorias.
É a partir do cálculo de todos os alimentos habitualmente ingeridos por uma pessoa que obtemos o consumo energético de cada indivíduo. Entretanto, nem sempre este balanço de energia está adequado, seja para mais ou para menos. Mas como saber qual a quantidade de calorias o idoso deve consumir? Cada pessoa tem a sua necessidade individual, que é o que chamamos de necessidade energética.
Com a redução da massa muscular e diminuição da atividade física que pode ocorrer com o envelhecimento, é comum que haja uma redução do gasto energético dos idosos, e, normalmente as necessidades calóricas das mulheres tendem a ser mais baixas que a dos homens. Entretanto, essa afirmação não é uma regra, pois existem diversas situações que podem aumentar o gasto energético, como a presença de doenças ou uma boa reserva de massa muscular, sendo assim, é essencial saber diferenciar o consumo alimentar do gasto energético daquele idoso, a fim de adequar a prescrição nutricional.
Embora existam diversos métodos para cálculo das calorias, a regra de bolso é uma das fórmulas mais utilizadas e recomendadas. A recomendação de calorias para idosos, como um ponto de partida, gira em torno de 30 – 35 calorias por kg de peso, onde o cálculo é feito apenas pela multiplicação das calorias pelo peso do idoso, mas que pode ser adaptada a depender da resposta de cada indivíduo.
Lembra daquele idoso que nos acompanhou durante os exemplos da antropometria? Pronto, agora iremos utilizar este mesmo caso para calcular as necessidades energéticas.
Para relembrar o caso clínico: homem idoso, com 70 anos de idade, ingestão alimentar habitual, sem perda de peso, peso atual de 73 kg, altura de 1,70m, IMC de 25,25 kg/m² (eutrófico), circunferência da cintura de 87 cm (adequada), circunferência do braço com adequação de 95,8% (eutrófico) e circunferência da panturrilha de 36 cm (adequada), aparentemente com um estado nutricional normal.
Portanto, se a recomendação inicial é de 30-35 calorias por kg:
- 30 calorias x 73 kg = 2190 calorias;
- 35 calorias x 73 kg = 2555 calorias.
Então, a necessidade energética para este idoso seria entre 2190 e 2555 calorias por dia.
Apesar deste cálculo, não podemos esquecer que outros fatores podem influenciar nas necessidades energéticas, como a própria composição corporal, cuja presença de maior quantidade de músculo requer também uma maior quantidade de energia, de forma semelhante a presença de doenças catabólicas (capazes de gerar quebra de muitos nutrientes) e a prática regular de atividade física, cuja prescrição nutricional deve ser adaptada.
Carboidratos
Os carboidratos são nutrientes também conhecidos como açúcares, são componentes amplamente encontrados nos alimentos e são o principal “combustível” para as nossas células. São divididos em carboidratos complexos e simples. Os carboidratos complexos são aqueles que possuem uma molécula maior, com digestão e absorção mais lenta, normalmente encontrados raízes e cereais integrais. Já os carboidratos simples são moléculas pequenas (no máximo duas), absorvidos rapidamente pelo trato digestório, causando picos na glicemia, como balas, doces, açúcar de mesa, mel e refrigerantes.
Figura 27: Alimentos fontes de carboidratos complexos.
A recomendação de carboidratos varia entre 45-65% de toda a energia consumida ao longo do dia, e, no máximo 10% do valor energético deve vir de carboidratos simples, visando a manutenção da saúde.
Proteínas
As proteínas têm função biológica estrutural, pois fazem parte do processo natural de construção e manutenção das estruturas corporais, compõem os músculos, órgãos, cabelos, unhas, hormônios, anticorpos e células e auxiliam em diversos processos do organismo. As proteínas são compostas por estruturas menores chamadas de aminoácidos, ou seja, um conjunto de aminoácidos origina uma proteína.
Os aminoácidos que compõem as proteínas podem ser classificados em essenciais e não essenciais. Os aminoácidos essenciais são aqueles que não são produzidos pelo nosso corpo e precisamos obtê-los através dos alimentos. Já os aminoácidos não essenciais são aqueles que somos capazes de produzir internamente.
Normalmente os alimentos fontes de proteína são de origem animal, como frango, peixes, carne vermelha, ovos, leite e queijos. No entanto, alguns alimentos de origem vegetal também são capazes de fornecer um bom aporte proteico, como a soja, feijões, grão de bico e lentilha.
Figura 28: Alimentos fontes de proteínas.
As necessidades de proteínas em idosos varia entre 1,0 a 1,5 gramas por kg de peso corporal por dia, mas, assim como a necessidade energética, a quantidade de proteínas pode ser ajustada de acordo com a atividade física, presença de doenças e estado nutricional. A faixa de 1,0 a 1,2g/kg de proteínas é utilizada para idosos saudáveis, podendo chegar a 1,5g/kg em casos de sarcopenia, por exemplo. Na desnutrição grave, oferta proteica também pode alcançar até 2,0 g/kg.
Uma boa ingestão de proteína no idoso ajuda a limitar os declínios funcionais relacionados a perda de massa muscular durante o processo de envelhecimento, principalmente quando essa proteína é fracionada em diversas refeições ao longo do dia, melhorando o aproveitamento proteico. Fontes proteicas de alto valor biológico devem estar presentes na alimentação do idoso, em virtude do perfil de aminoácidos essenciais, que podem ser encontrados em carnes, ovos e leites e derivados.
Sendo assim, se a recomendação é entre 1,0 a 1,5g de proteínas por kg, e retomarmos os 73kg do paciente idoso do caso clínico, basta multiplicar este valor pelo peso. Logo 1,0g x 73kg = 73 gramas e 1,5g x 73kg= 109,5 gramas, portanto, este idoso precisa de no mínimo 73 gramas de proteínas por dia e no máximo 109,5 gramas por dia.
Gorduras
As gorduras, também chamadas de lipídios, são uma das principais formas de estoque de energia no corpo humano. No organismo, as gorduras servem como isolante térmico e possuem funções em estruturas celulares, para a produção de hormônios e fornecimento de energia. Existem vários tipos de gorduras, classificadas em saturadas, insaturadas e trans.
- Gorduras saturadas: apresentam importância biológica considerável, mas o consumo excessivo é um dos principais responsáveis por aumentar o colesterol ruim (LDL) e elevar o risco cardiovascular, através do depósito de gordura na parede das artérias;
- Gorduras insaturadas: divididas entre monoinsaturadas e poliinsaturadas. As gorduras monoinsaturadas fazem parte da estrutura da membrana das células corporais e contribuem para melhorar a saúde dos vasos sanguíneos. Já a gordura poliinsaturada pode aumentar o colesterol bom (HDL) e reduzir o colesterol ruim (LDL), o que ajuda a prevenir o entupimento de artérias, além de ser parte da composição de neurônios;
- Gordura trans: são originadas a partir do aquecimento muito elevado de alguns óleos insaturados em processos industriais, fazendo com que a gordura insaturada perca seu potencial benéfico e se torne uma gordura trans, com potencial ainda maior que a gordura saturada de causar doenças cardíacas e cerebrais, mesmo em pequenas quantidades, por aumentar a concentração de colesterol ruim (LDL) e reduzir o colesterol bom (HDL).
Abaixo é apresentada uma tabela dos alimentos fontes de cada tipo de gordura.
Quadro 6: Alimentos fontes de cada tipo de gordura.
Tipo de gordura | Alimentos |
Saturadas | Óleo de coco, óleo de palma, leite integral, queijos amarelos, banha de porco, biscoitos recheados, manteiga, creme de leite, carnes gordas (como bacon, costela, picanha) e embutidos (salsicha, linguiça, mortadela). |
Insaturadas | Azeite de oliva, óleo de girassol, canola, milho, algodão e soja, ovos, castanhas, abacate, linhaça, peixes. |
Trans | Margarina, biscoitos, frituras industrializadas (por exemplo nuggets e miojo), gordura vegetal hidrogenada, sorvetes, bolos, batata frita. |
A recomendação de gorduras varia entre 20-35% das calorias totais diárias, dando prioridade as gorduras insaturadas (monoinsaturadas 15% e poliinsaturadas 5 a 10%), seguidas das saturadas (no máximo 10%) e por último as trans (não devem fazer parte da dieta, necessitam ser excluídas).
Figura 29: Alimentos fontes de gorduras insaturadas.
Fibras
As fibras devem fazer parte de um consumo nutricional equilibrado, visto que auxiliam principalmente na saúde intestinal, permitindo um funcionamento intestinal adequado, além de favorecer o controle da glicemia e até mesmo o controle do peso corporal. A recomendação de fibras para idosos é de 25 gramas por dia, mas que deve ser associada a uma ingestão de líquidos adequada ao longo do dia.
Figura 30: Alimentos fontes de fibras.
Líquidos
Os idosos tendem a não beber líquidos suficientes devido a sensação reduzida de sede. A ingestão de líquidos adequada previne a desidratação, ajuda na digestão da alimentação, absorção de nutrientes e no funcionamento intestinal adequado. As mulheres idosas devem receber entre 1,6 a 2,0 litros de líquidos diariamente, enquanto homens idosos devem consumir entre 2,0 a 2,5 litros de líquidos por dia.
Entretanto, as necessidades de líquidos também possuem relação com outras condições, pois, o consumo de energia, perdas de água, temperaturas elevadas, intensidade da atividade física e presença de doenças podem alterar a necessidade de água.
Vitaminas e minerais
As vitaminas e os minerais são considerados micronutrientes essenciais para o funcionamento do nosso corpo, cuja deficiência pode ocasionar uma série de repercussões clínicas. No paciente idoso existem alguns micronutrientes que ganham espaço, devido a idade avançada, como é o caso do cálcio, vitamina D, ferro, zinco e vitamina B12.
- Cálcio: é um mineral importante para a saúde óssea, prevenindo a osteoporose, cuja recomendação é de 1200 miligramas por dia. As principais fontes de cálcio são os leites e derivados;
- Ferro: a deficiência deste mineral pode estar associada a ocorrência de anemia. A recomendação é de 8 miligramas por dia e pode ser encontrado de forma mais abundante em carnes vermelhas;
- Zinco: é um mineral presente em diversos processos corporais e também na função imunológica, que pode ser comprometida se houver deficiência. A recomendação é de 11 miligramas por dia para homens e 8 miligramas por dia para mulheres e pode ser encontrado em carnes, castanhas e leguminosas;
- Vitamina D: é uma vitamina que possui relação com a saúde óssea, cuja deficiência pode levar a perda de massa óssea e risco de quedas e fraturas. A recomendação é de 20 microgramas por dia, a principal fonte é a luz solar e os alimentos com vitamina D são os leites e derivados, ovos e peixes;
- Vitamina B12: a capacidade de absorver a vitamina B12 diminui ao longo da idade, devido a menor acidez gástrica do idoso, podendo haver deficiência deste nutriente. A recomendação é de 2,4 microgramas por dia e os alimentos fontes deste nutriente são de origem animal, como carnes, peixes e laticínios;
- Vitamina C: a vitamina C é um micronutriente fácil de ser alcançado através da alimentação, pois pode ser encontrada em frutas, verduras e sucos. A recomendação é de 90 miligramas por dia para homens e 75 miligramas por dia para mulheres. Atenção especial deve ser dada a suplementação de vitamina C, pois o excesso é eliminado na urina e pode favorecer a formação de cálculo renal.