A origem de uma constituição normalmente se relaciona à uma mudança de era num Estado. Diz-se que o poder para fazer surgir uma nova Constituição é o poder originário, decorrente diretamente do povo. Esse poder somente se manifesta de maneira ativa em situações muito específicas.
A constituição escrita, no geral, dita as “regras do jogo”. Logo, uma nova constituição tem de ser escrita quando essas “regras” mudam. Geralmente após uma revolução (ou golpe), quando as estruturas de poder são bastante alteradas, uma nova constituição é formada.
O grupo que se reúne para discutir e redigir a nova constituição é denominado de Assembléia Constituinte, e são eles os detentores do poder de criar as novas regras do jogo. Passado esse momento transitório, de criação constitucional, as alterações posteriores serão fruto de um poder derivado, ou secundário, que deve cumprir as regras impostas pelo poder originário.
Esse conhecimento de ciência política é basilar para compreendermos a origem da Constituição brasileira.
No nosso curto período de civilização, nos moldes de uma civilização ocidental, estivemos diante de sete constituições. Isso, somado às Ordenações Portuguesas, vigentes na época do Brasil colônia, forma todo o arcabouço legislativo escrito que tivemos ao longo da existência pátria.
A atual Constituição Brasileira é apelidada de Constituição Cidadã por conta de seu período histórico. Em 1964, o Brasil foi alvo de um Golpe Militar, quando foi instaurada uma ditadura no país. Em 1967, a ditadura editou a sua Constituição - como dito, após uma modificação nas regras do jogo, muda-se a Constituição.
Em 1969, o Brasil enfrentava uma grave crise política. Como forma de endurecer a ditadura, os militares emendaram a Constituição de maneira tão agressiva, e com tantas modificações no texto constitucional que alguns teóricos consideram haver aí uma nova Constituição. Por essa conta, o Brasil teria oito constituições, ainda que apenas sete de maneira oficial.
Contudo, com o fim da ditadura em 1984, houve o retorno à democracia. Neste retorno, mais um aspecto curioso de nossa história: ainda sob vigência da Constituição de 1967 (com todas as emendas de 1969), o governo brasileiro (pós-ditadura) decretou a Emenda Constitucional nº 26. Essa Emenda convoca a Assembléia Constituinte que será responsável pela redação da Constituição atual.
Há teóricos que afirmam haver aí uma situação excepcional. Isso porque uma nova Constituição simboliza uma ruptura com o status quo anterior. Por mais que algumas normas decretadas em constituições anteriores possam ser recepcionadas pela nova Constituição, essa nova Carta Máxima muda as regras do jogo. Portanto, uma emenda que convoque uma Assembléia Constituinte seria uma aberração, uma maneira de uma Constituição morta autorizar (de forma desnecessária) a criação de uma nova Constituição.
Enfim, de maneira prática, o que importa é que a atual Constituição foi elaborada e passou a viger em 1988. Seu texto constitucional é dividido em três partes: o preâmbulo, o texto constitucional em si, e o Ato de Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT.
O preâmbulo é um pequeno texto que abre a Constituição. Sua força é mais política e simbólica do que jurídica. O preâmbulo não pode ser utilizado como fundamento jurídico, nem tem força suficiente para que, com base nele, seja decretada a inconstitucionalidade de alguma norma. Entretanto, pode servir como um parâmetro de interpretação para as demais normas constitucionais (ainda que não possua caráter vinculante).
O texto constitucional será trabalhado ao longo deste curso. É a carne da Constituição, as suas normas perenes. É interessante observar que os aspectos da sociedade mais importantes para a Assembléia Constituinte são postos logo à frente da Constituição. Analisar a ordem com que os temas são tratados é uma maneira interessante de perceber as prioridades de cada Estado.
Por exemplo, a Constituição Federal de 1967 inicia apresentando a estrutura do Estado, suas competências, a sua forma de organização. De outro lado, a Constituição Cidadã de 1988 apresenta em seus primeiros artigos os direitos dos cidadãos brasileiros. O artigo 5º é o maior artigo da Constituição, elencando com riqueza de detalhes os direitos dos cidadãos brasileiros.
Interessante também observar que o texto constitucional de 1988 sofre reflexos dos temores da ditadura. As limitações ao poder do Estado de atuar, a preocupação com a imparcialidade do juiz, a presunção da inocência, os direitos dos representantes populares e suas imunidades perante à própria justiça são descritos com riqueza de detalhes.
Por fim, a Constituição finaliza com um conjunto de normas de caráter transitório - ADCT. São essas normas constitucionais de transição, para que seja possível uma transição mais amena entre o antigo regime e o novo. A intenção dessas normas é desaparecer assim que o novo regime for estabelecido. Não é o que ocorre. A ADCT é frequentemente alvo de emendas constitucionais, fazendo com que as normas se perpetuem ao longo do tempo.