AS CONTRIBUIÇÕES DA AMÉRICA LATINA PARA OS ESTUDOS DA COMUNICAÇÃO
A trajetória histórica da América Latina é marcada por verdadeiras batalhas, travadas entre diferentes forças, cujo desfecho resultou numa cultura híbrida e numa sociedade ávida pela quebra da desigualdade social e pela democratização do conhecimento. E quando se fala em conhecimento, nesse cenário, deve se pensar em todas as suas fases, desde a educação básica até os saberes científicos. Mas em “Latinoamérica” – como dizem os hermanos dos países de língua hispânica –, o acesso à informação ainda está longe de ser uma realidade para todos.
Não há como negar: o subcontinente latino-americano possui características muito distintas às dos Estados Unidos e da Europa, ambientes de “primeiro mundo” em que as reflexões sobre os fenômenos sociais, entre eles o da comunicação social, vigoram como referencial dominante. Por isso mesmo, Escola Latino-Americana de Comunicação: a nova hegemonia, do pesquisador mexicano Gustavo Adolfo León Duarte, constitui-se como obra audaciosa por projetar a pesquisa em comunicação produzida no espaço aqui descrito como cognição fortalecida no território que lhe é de direito. León Duarte, professor do Departamento de Psicologia e Ciências da Comunicação da Universidade de Sonora (México), tem se debruçado sobre teorias e métodos desenvolvidos pelo campo latino-americano da comunicação ao longo de boa parte de sua vida acadêmica, marcada, principalmente, pelo doutorado defendido na Universidade Autônoma de Barcelona (Espanha), em 2006.
A obra editada no Brasil, fruto de sua tese doutoral, abaliza as atuais tendências do pensamento comunicacional na América Latina, tendo como pano de fundo a produção sistematizada pelos registros de oito edições do Colóquio Internacional sobre a Escola Latino-Americana (Celacom), evento promovido anualmente, desde 1997, pela Cátedra Unesco/Metodista de Comunicação para o Desenvolvimento Regional. Como rigoroso trabalho científico, aponta os passos seguidos pelo pesquisador, no decorrer de sua investigação, tendo os procedimentos metodológicos devidamente sinalizados, inclusive no que diz respeito aos critérios adotados para a observação de seu objeto de estudo. Destaca-se, nesse sentido, o quadro disponibilizado após os capítulos, resultante da metodologia testada no desenvolvimento desse trabalho, no qual estão sistematizadas cinco categorias de análise e indicados 20 índices descritivos que podem ser adotados em pesquisas sobre estudiosos ou grupos científicos, tanto do campo da comunicação quanto de outras áreas do conhecimento.
Cabe dizer que o livro, publicado originalmente em espanhol, foi traduzido para o português para compor a Série Anais da Escola Latino-Americana de Comunicação, na qual representa o 10º volume. Aliás, foram os primeiro oito números dessa coleção que León Duarte se baseou para o desenvolvimento de sua pesquisa, observando que 81% do conteúdo publicado nessas edições foi escrito em língua portuguesa e apenas 19% em castelhano. Seu conteúdo divide-se, basicamente, em três partes, sendo que a primeira delas, intitulada “ELACOM: do referencial histórico à conquista da hegemonia do pensamento latino-americano de comunicação”, traça um panorama sobre o caminho trilhado pela Escola Latino-Americana de Comunicação, desde sua origem, marcada pelo ensejo do ensino comunicacional nos primeiros centros universitários do continente, seguida do protagonismo dos pioneiros institutos de pesquisa, até seu fortalecimento dentro do universo acadêmico.
Dando o devido reconhecimento às instituições paradigmáticas e aos ícones do campo comunicacional que se destacaram por suas iniciativas, o texto tenciona ideias e posicionamentos gerados ao longo dos anos, dando margem à interpretação do que, de fato, constitui a Elacom: um movimento mestiço que congrega os aportes teóricos das matrizes norte-americanas (funcionalistas) e européias (críticas), fortalecendo-se conforme as necessidades dos países que representa. E é exatamente nesse ponto que o nova hegemonia no pensamento comunicacional latino-americano”.
Ali, ele identifica os caminhos seguidos pela nova geração de pesquisadores latino-americanos, observando fortes incidências de um sincretismo metodológico; da teoria crítica como referencial com o qual mais se identifica a Elacom, em virtude, principalmente, dos conturbados anos de repressão experimentados por quase todos os países da América Latina entre as décadas de 1960 e 1980; e do compromisso social e ético como fator diferencial nos estudos comunicacionais elaborados nesse ambiente. Entre uma ponta e outra, o livro ainda dedica especial atenção às articulações do pesquisador mexicano a respeito dos textos publicados em oito volumes da Série Anais da Escola Latino-Americana de Comunicação. Nesse momento, León Duarte aprofunda sua percepção em torno dos livros, revelando os principais subsídios que podem ser extraídos de cada um deles no exercício da compreensão sobre o atual momento da pesquisa em comunicação na América Latina.
Verdadeiramente, as contribuições oferecidas por essa obra ao pensamento em comunicação são muitas, principalmente por dar destaque a um cenário que tem sido esquecido nos ambientes acadêmicos e por valorizar a produção continental sobre os fluxos midiáticos vigentes em seu território. Hoje, percebe-se que os jovens pesquisadores têm demonstrado grande interesse em desvendar os enigmas das novas tecnologias, ancorados em referências globais, deixando de lado a identidade dos territórios em que se situam. As reflexões de Gustavo León Duarte, portanto, são motivo de “alegria e esperança” – como bem destaca o professor José Marques de Melo em seu prefácio – à comunidade acadêmica que defende a legitimação e a autonomia dos movimentos comunicacionais em tal cenário. Ainda nesse sentido não seria nada ousado dizer que Escola Latino-Americana de Comunicação: a nova hegemonia traz um alento aos pesquisadores da área e revigora o orgulho de ser latino-americano e a urgência de lutar para o crescimento desse espaço geográfico, onde ainda há muito para se fazer. Assim sendo, mostra claramente que o melhor caminho para o campo comunicacional avançar é valer-se das conjunturas metodológicas, epistemológicas e contextuais tão próprios a essa região.
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