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Poderes e Deveres do Administrador Público

O Estado, por ser uma abstração jurídica, não pode atuar diretamente e, por isso, depende dos agentes públicos para cumprir suas funções. Esses agentes, em diferentes níveis de atuação, recebem prerrogativas, conhecidas como poderes administrativos, para garantir o interesse público.

Deveres do Administrador Público

Os poderes administrativos são concedidos por lei e têm como objetivo principal viabilizar a atuação do Estado em prol da sociedade. Contudo, ao mesmo tempo em que possuem poderes, os agentes públicos também têm deveres, formando o binômio poder-dever. 

Diferente da esfera privada, onde o poder é uma faculdade, na Administração Pública, o poder é uma obrigação. Ou seja, o administrador público não pode deixar de agir quando há uma necessidade, sob pena de responsabilidade do Estado e do próprio agente.

Dever de obediência

Entre os principais deveres dos agentes públicos está o dever de obediência às ordens legais, que devem ser seguidas fielmente. No entanto, o agente não é obrigado a cumprir ordens ilegais, e o descumprimento pode gerar consequências. 

Dever de prestar contas

Além disso, o dever de prestar contas é fundamental, já que os administradores gerenciam bens e recursos que pertencem à coletividade, sendo obrigados a demonstrar transparência em suas ações.

Dever de lealdade

Outro importante dever é o de lealdade, que exige que o servidor público atue com total dedicação ao serviço e respeito às leis e às instituições. O descumprimento desse dever pode levar a sanções graves, como a demissão. 

Dever de eficiência

O dever de eficiência, por sua vez, impõe que o servidor atue com rapidez, perfeição e bom rendimento, sendo uma obrigação constante de buscar a melhor administração possível dos recursos públicos.

Dever de probidade

Por fim, o dever de probidade exige que os atos dos agentes públicos sejam não apenas legais, mas também éticos e em conformidade com a moralidade administrativa. O descumprimento desse dever pode resultar em severas penalidades, incluindo a perda do cargo e a suspensão de direitos políticos.

Poderes do Administrador Público

Os poderes não são privilégios pessoais, mas instrumentos que permitem ao administrador cumprir suas obrigações, ou seja, eles não exercem poder por escolha, mas por dever.

Poderes discricionários e vinculados

Os poderes discricionário e vinculado são dois conceitos fundamentais para o funcionamento da Administração Pública. Eles definem a extensão da liberdade de decisão dos administradores públicos em suas ações, sempre visando ao interesse público.

  • Poder Discricionário

Esse poder ocorre quando a lei não determina de forma precisa todas as condutas a serem adotadas pelos administradores públicos. Diante de situações complexas e variadas, a lei permite ao administrador público decidir com maior liberdade, avaliando a conveniência e a oportunidade da sua ação. 

A discricionariedade refere-se, portanto, à possibilidade de o agente público escolher entre várias alternativas válidas, sempre em consonância com os interesses coletivos.

Entretanto, é crucial destacar que essa liberdade não é ilimitada. O administrador está sempre vinculado aos limites da legalidade e, por isso, não pode agir com arbitrariedade ou de maneira contrária à lei. 

A discricionariedade está restrita ao que a norma permite, e qualquer excesso pode ser revisado judicialmente com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. A Administração tem, portanto, uma margem de manobra, mas sempre dentro de parâmetros legais.

Imagine que uma cidade está enfrentando uma crise de trânsito e poluição. O prefeito tem à sua disposição um orçamento para projetos ambientais e de mobilidade urbana. Ele pode optar por investir na criação de ciclovias ou na construção de um parque urbano que ajude a reduzir a poluição e oferecer áreas de lazer para os cidadãos. 

Nesse caso, ele tem liberdade para decidir qual projeto será mais conveniente e oportuno para melhorar a qualidade de vida da população. Esse é um exemplo de poder discricionário, pois o gestor público tem a liberdade de escolher entre alternativas, desde que a decisão esteja alinhada ao interesse público e dentro da legalidade.

  • Poder vinculado

Diferente do discricionário, o poder vinculado ocorre quando a lei estabelece de forma clara todos os requisitos e etapas de uma determinada ação administrativa, sem margem de escolha para o administrador. 

Nesse caso, o agente público tem pouca ou nenhuma liberdade para decidir. A lei já determinou previamente o que deve ser feito, e a Administração Pública apenas executa o que está previsto.

Por exemplo, um cidadão que solicita a emissão de sua carteira de identidade em um posto de atendimento. Se ele apresentou toda a documentação necessária e preenche os requisitos legais, a Administração Pública é obrigada a emitir o documento, sem possibilidade de negar ou adiar o pedido. 

Nesse caso, o funcionário responsável deve seguir estritamente a norma, sem poder escolher outra conduta. Este é um claro exemplo de poder vinculado, pois a ação do servidor está rigidamente determinada pela lei.

Poderes regulamentares

O poder regulamentar permite à Administração Pública, especialmente ao chefe do Poder Executivo, detalhar e complementar a aplicação das leis, tornando-as operacionais. Sua principal função é possibilitar que as leis, muitas vezes gerais e abstratas, sejam aplicadas de maneira eficaz nas situações práticas enfrentadas pela administração. 

O instrumento mais comum desse poder são os decretos, que detalham as normas legais para garantir sua execução.

Diferentemente do poder de regulação, que envolve não apenas a criação de normas, mas também sua fiscalização e a aplicação de sanções, o poder regulamentar se limita a complementar as leis, sem criar direitos ou obrigações novas. Isso significa que o poder regulamentar deve estar subordinado à legislação, não podendo inovar ou alterar o conteúdo das leis já existentes.

Celso Antônio Bandeira de Mello adverte sobre o risco de abusos no uso desse poder, pois se a Administração ultrapassar os limites da lei ao regulamentá-la, pode violar o princípio da legalidade. 

O poder regulamentar não deve criar obrigações ou restrições que não estejam previamente estabelecidas pela lei, sendo sua função apenas permitir que a lei seja cumprida de maneira eficaz.

Existem diferentes níveis de regulamentação, com os atos mais comuns sendo os decretos expedidos pelos chefes do Executivo. Contudo, outros órgãos, como ministérios e agências reguladoras, também podem editar atos normativos secundários, como portarias e instruções normativas, que são formas de regulamentação de segundo grau. Esses atos ajudam a detalhar e viabilizar a execução das leis e decretos.

Os decretos regulamentares, no entanto, não possuem o mesmo status jurídico das leis. Enquanto as leis criam direitos e obrigações novas, os decretos regulamentares servem para especificar como esses direitos e obrigações serão aplicados. 

Devido à sua natureza secundária, os decretos regulamentares estão sujeitos ao controle de legalidade, podendo ser anulados pelo Judiciário caso ultrapassem os limites estabelecidos pela lei.

Em casos de abuso, o Congresso Nacional tem o poder de sustar os efeitos de decretos que exorbitem o poder regulamentar. A sustação não cancela o decreto, mas retira sua eficácia, impedindo que ele produza efeitos.

Poder hierárquico

O poder hierárquico organiza as atividades da Administração Pública em uma estrutura vertical, onde órgãos e agentes são subordinados uns aos outros. Esse escalonamento facilita a realização de funções administrativas e estabelece uma relação jurídica entre superiores e subordinados, conhecida como relação hierárquica. Embora mais evidente no Poder Executivo, essa relação pode existir em qualquer poder, sempre que funções administrativas sejam exercidas, incluindo o Legislativo e o Judiciário. No entanto, quando parlamentares ou juízes estão desempenhando suas funções típicas, como legislar ou julgar, não há subordinação hierárquica.

O poder hierárquico permite à Administração distribuir tarefas, fiscalizar ações e revisar decisões de seus agentes, assegurando a ordem e o funcionamento eficiente do serviço público. Junto a ele, atua o poder disciplinar, que garante a aplicação de sanções quando subordinados descumprem ordens ou cometem infrações administrativas. Esse poder de punição é fundamental para que a hierarquia funcione adequadamente.

Entre as prerrogativas do poder hierárquico estão ordenar, fiscalizar, revisar, delegar e avocar funções.

  • Ordenar: A ordenação é uma prerrogativa que confere ao superior hierárquico a capacidade de determinar as condutas que devem ser seguidas pelos subordinados. Isso significa que o superior pode emitir ordens, instruções ou diretrizes que os subordinados devem cumprir no exercício de suas funções.
  • Fiscalizar: O poder de fiscalizar permite que o superior hierárquico acompanhe e supervisione o desempenho dos subordinados, garantindo que as atividades sejam realizadas conforme as ordens e diretrizes emitidas.
  • Revisar: A revisão é a prerrogativa que confere ao superior hierárquico a faculdade de analisar os atos praticados pelos subordinados. A revisão pode resultar na manutenção, anulação, modificação ou convalidação de atos administrativos, sempre que necessário para garantir a legalidade e a eficiência do serviço público.
  • Delegar: A delegação permite que o superior hierárquico transfira certas atribuições de sua competência para um subordinado ou outro órgão. Esse mecanismo é utilizado para descentralizar decisões e agilizar o processo administrativo, distribuindo responsabilidades de maneira mais eficiente.
  • Avocar funções: A avocação é a prerrogativa que permite ao superior hierárquico chamar para si a responsabilidade pela prática de determinado ato ou função que, originalmente, estaria sob a competência de um subordinado.

É importante não confundir subordinação hierárquica com vinculação administrativa. A subordinação é interna e ocorre entre órgãos de uma mesma entidade, enquanto a vinculação administrativa envolve controle externo entre diferentes entidades, como o controle finalístico da Administração Direta sobre a Indireta.

Poder disciplinar

O poder disciplinar permite à Administração Pública investigar infrações e aplicar penalidades aos servidores ou particulares que tenham algum vínculo contratual ou estatutário com o Estado. Ele não se restringe apenas aos servidores públicos, mas alcança também empresas contratadas e outros indivíduos que possuam uma relação especial com a Administração. 

Há uma falsa ideia de que o poder disciplinar é totalmente discricionário, ou seja, que o administrador público teria liberdade absoluta para decidir como punir. No entanto, essa discricionariedade é limitada, pois a autoridade tem o dever de investigar e punir infrações. 

Ou seja, o administrador não pode simplesmente escolher se quer ou não punir um infrator. Ele tem a obrigação de agir, uma vez que a irregularidade seja constatada, conforme estabelece o art. 143 da Lei 8.112/1990. Se não o fizer, poderá ele mesmo ser responsabilizado, de acordo com o Código Penal (art. 320).

Ainda assim, existem margens para discricionariedade no poder disciplinar, especialmente na escolha da sanção a ser aplicada. Por exemplo, a Lei 8.112/1990 prevê a demissão para casos de insubordinação grave, mas não define o que constitui essa "gravidade". 

Isso deixa uma certa flexibilidade para a Administração interpretar e decidir sobre o caso concreto. Da mesma forma, a suspensão, que pode variar de 1 a 90 dias, permite que a autoridade avalie a gravidade da infração e escolha a duração adequada da punição.

Além disso, a discricionariedade é limitada pela necessidade de motivação. A Administração deve sempre justificar a aplicação de uma penalidade, explicando os fatos e fundamentos legais que a embasam. Essa exigência está prevista no art. 50 da Lei 9.784/1999 e na Lei 8.112/1990, garantindo que o ato punitivo seja válido e transparente.

Poder de polícia

O poder de polícia é a faculdade conferida à Administração Pública para limitar ou disciplinar direitos individuais em prol do interesse coletivo. A definição legal desse poder está no art. 78 do Código Tributário Nacional (CTN), que o descreve como a atividade administrativa que regula direitos e liberdades em razão de interesses públicos, como segurança, higiene, ordem e costumes.

Embora alguns críticos afirmem que a expressão “poder de polícia” remonta a um período de domínio irrestrito do Estado, como no antigo "Estado de Polícia", o conceito moderno está alinhado ao princípio do Estado de Direito. Dessa forma, a atuação do poder de polícia deve estar sempre vinculada à legalidade, respeitando os princípios constitucionais como impessoalidade, moralidade e publicidade.

Na prática, o poder de polícia se manifesta em atividades que restringem liberdades individuais quando necessário para proteger o bem-estar coletivo. Por exemplo, ao impedir a abertura de um estabelecimento comercial sem condições sanitárias adequadas, o Estado está exercendo seu poder de polícia para garantir a saúde pública.

O conceito doutrinário do poder de polícia ressalta sua função de condicionamento do uso e gozo de direitos individuais, como propriedade e liberdade, em benefício do coletivo. Um exemplo prático é o processo para obter a carteira de habilitação. 

O Estado exige que o particular passe por exames e aulas antes de conduzir um veículo. Essa exigência restringe a liberdade de dirigir para proteger a segurança coletiva nas vias públicas.

O poder de polícia, portanto, pode ser visto como uma intervenção do Estado que, apesar de restringir liberdades individuais, visa proteger o interesse público. Ele pode ser exercido de maneira discricionária em alguns casos, mas sempre deve estar fundamentado na lei e obedecer ao devido processo legal.

Por fim, é importante diferenciar o poder de polícia de outras atividades administrativas, como a prestação de serviços públicos. Enquanto os serviços públicos oferecem benefícios aos particulares, o poder de polícia geralmente implica limitações ou condicionamentos às liberdades individuais em benefício da coletividade.



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